quinta-feira, 16 de maio de 2019

Crônicas Amadoras #5: O Casal da Meia-Noite e Dois


O Casal da Meia-Noite e Dois
por Miguel Boisseleau

Uma crônica amadora quase toda semana...







Gosto de escrever sobre pessoas. Elas são feias e chatas, como eu, mas bem interessantes. Também gosto de abraça-las. Ontem de noite ouvi duas pessoas bem feias conversando. Tanto faz a vida privada delas, são meus personagens. Sendo assim, posso falar do que eu quiser e a qualquer momento. Meia-noite e dois, e uma cobertura no Leblon.

O marido andava de um canto da sala ao outro, batendo firmemente o pé no chão e esperando, em vão, causar um ar de descontento. Sua mulher tinha jogado seus pertences fora, ela havia descoberto que ele a traía. Imagino que as coisas já não estavam mais tão interessantes entre os dois, infelizmente. O homem, preocupado com a opinião que seus amigos fariam dele, se encontrava preso em uma reflexão tão profunda, e tão vã, sobre como tornar a situação ao seu favor. Talvez ele até preferisse uma forte dor nas costas do que este peso na consciência.

Não é fácil viver com culpa.

A mulher, sentada à mesa, chorava uma lágrima solteira, virgem, tão inocente e tão sabia. Ser digno da confiança de alguém vai muito além de flores e carinhos, a raison d’être desta virtude seria, se eu tiver bem vivido até aqui, a honestidade. Não pelo dever de sermos honestos e humildes frente ao mundo, pois já sabemos isto e não preciso repetir, mas sim pelo amor que devemos ao Amor. A esposa viu um mundo se acabar aos seus pés. As flores já não valiam mais nada, muito menos os cuidados (se é que eram honestos). Ela só queria acreditar de novo no amor.

O homem gritava com ela. Mas por que razão? Por ele ter sido um incompetente? Por ele não saber assumir seus erros? Ou talvez, por ele querer experimentar novas carnes, pois, a este ponto os corpos se tornaram objetos. Eu não quero saber. Já tenho minhas culpas e desculpas, não preciso saber dos erros dos meus personagens, não agora. Eles se vão tão rápido como degraus em queda. Já o marido, faz de seu triunfo um passo mais perto daquilo que ele procura tão em vão: uma felicidade inútil, banal, amaldiçoada, nula.

Nada mais faz sentido, nem mesmo o final dessa crônica.


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