domingo, 17 de junho de 2018

Crise no Rio de Janeiro

A Crise do Rio de Janeiro é real
Por Luca Szaniecki Cocco

Um detalhado texto sobre como nasceu a crise e suas consequências, focando principalmente no Estado do Rio.



2018 marca mais um ano de uma crise que tortura o Brasil e que atinge principalmente os mais pobres. Não é surpresa que são sempre eles os que pagam mais caro por todas as crises. A desigualdade subiu com uma velocidade exorbitante depois de anos de suposto progresso social com o governo do PT. É preciso, porém, notar que o processo começado por Lula já parecia começar a desacelerar logo antes da crise, nos últimos momentos do primeiro mandato de Dilma. De fato, em outubro de 2014 o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgou uma pesquisa mostrando a ligeira volta da pobreza entre 2012 e 2013 passando de 10,08 a 10,45 milhões de brasileiros abaixo da linha de pobreza. O aumento pode ser pequeno mas marca o começo da queda. Curiosamente, a pesquisa passou pela surdina durante as eleições e depois da vitória de Dilma (provavelmente por motivos políticos, ouso dizer, o PT não podia manchar sua imagem).

Hoje em dia o nível de desigualdade chega a níveis inimagináveis depois de anos de crescimento econômico e todo o discurso em volta dos países emergentes, em destaque os BRICS, grupo do qual o Brasil faz parte. Em 2018, o economista Thomas Piketty, conhecido por sua obra Capital no século XXI” (essencial para entender as desigualdades modernas) coordenou entre outros a Pesquisa Desigualdade Mundial 2018. A pesquisa mostra que quase 30% da renda do Brasil se concentra nas mãos do 1% mais rico, o que corresponde à maior concentração do mundo. Quanto aos 10% mais ricos, estes possuem 55% da renda total.

Outro estudo (de 2017), dessa vez pela Oxfam, revelou que os 6 brasileiros mais ricos, ou seja Jorge Paulo Lemann (AB Inbev), Joseph Safra (Banco Safra), Marcel Herrmann Telles (AB Inbev), Carlos Alberto Sicupira (AB Inbev), Eduardo Saverin (Facebook) e Ermírio Pereira de Moraes (Grupo Votorantim) concentram a mesma riqueza que os 100 milhões de brasileiros mais pobres, ou seja metade da população. Aliás, os irmãos Marinho, herdeiros de Roberto Marinha, fundador da Rede Globo, estão nessa lista de maiores riquezas (cada um concentra aproximadamente 4,3 bilhões de reais de patrimônio).

Mais um estudo (depois desse eu paro), da OCDE (organização para a cooperação e o desenvolvimento econômico), desse ano, mostra que famílias pobres podem levar até 9 generações para alcançar níveis médios de renda.

Em 2017, o Brasil despencou 19 posições no ranking de desigualdade da ONU, entrando para a lista dos 10 países mais desiguais. O principal causa dessa desigualdade (sem entrar em questões como reforma tributária, PEC dos gastos, etc) é a queda da renda. Em 2017 a queda foi de 0,56 do rendimento de todas as fontes (salários, aposentadorias, pensões, benefícios sociais). O rendimento do trabalho baixou de 1,36% em geral mas 2,45% entre os 50% mais pobres. Estes últimos receberam em média 754 reais, menor que o salário mínimo. Os 10% mais ricos podem ter perdido 2,98% de sua renda mas os 10% mais pobres perderam 15,2% e um número ainda mais assustador é o dos 5% mais pobres que perderam 38%. Aliás, a renda destes últimos alcança a soma de 47 reais mensais. A queda da renda se deve pelo alto nível de desemprego que atinge 13,7 milhões de pessoas hoje, mas também os cortes nas despesas em geral e ao aumento da precaridade trabalhista.

Além de disparidades econômicas, o Brasil permanece com resultados ridículos no que diz respeito à avanços no combate ao racismo e ao sexismo. De fato, pretos e pardos recebem respectivamente 55,8 e 57% do salário dos brancos e mulheres recebem 77,5% dos salários dos homens em média (além de serem menosprezadas no campo político com uma participação de 10% no Congresso).

Enfim, todas as regiões e estados do Brasil parecem conhecer os efeitos dessa crise. A região Nordeste parece, seguindo sua linha histórica, a mais preocupante em termos sociais e econômicos (metade da população recebe 487 reais mensais em média, ou seja 50% do salário mínimo) porém, o estado do Rio parece ser o mais afetado pela crise em específico. Não que a crise em outros cantos do país seja grave mas ela parece ter mais efeitos específicos no Rio de Janeiro que nos demais estados (ou talvez ele seja apenas o mais “midiatizado”).

O objetivo desta introdução, e do resto do artigo a seguir, é chocar, mas também é destruir os discursos iniciais (que já parecem terem desaparecido em parte) de alguns setores mais “progressistas” do espectro político que tentaram inventar a narrativa que a crise fora criada pela mídia, pelo neoliberalismo e até mesmo, nos casos mais extremos, pelos Estados-Unidos, pela CIA, pelo FMI, no objetivo de privatizar tudo. O que mais me surpreende nesse discurso é a hipocrisia desses setores que tentam mistificar a crise enquanto ela ataca as camadas da sociedade que estes mesmos “mistificadores” juram defender: as camadas populares. Hoje em dia, os mesmos que propagavam esse discurso nos princípios da crise parecem ter parado de falar, por vergonha eu suponho, ao perceberem que a crise é real, talvez não para eles, mas para muitos. Embora tenha parcialmente desaparecido, o discurso tem seus efeitos ainda presentes no cenário político. Não deformem meu texto: não defendo privatização alguma, nem o neoliberalismo, nem o que seja, estou aqui para expor fatos.

Para resumir, esse artigo pretende esclarecer alguns fatos e dados impressionantes (e às vezes pouco conhecidos) sobre a crise. Veremos então o contexto no qual nasceu a crise do Rio de Janeiro e seus efeitos sociais e econômicos (não trataremos da crise política com detalhes, embora será mencionada por sua proximidade).

I)O contexto da crise

Alguns se surpreendem por ser justamente o Rio de Janeiro, que parecia conhecer um “boom” econômico sem precedentes, um dos mais afetados pela crise. Irei tentar mostrar nessa parte o contexto no qual nasceu essa terrível crise, antes de apresentar dados concretos e surpreendentes desta.

Primeiro, vou desmentir algumas explicações que dão para a crise no Rio de Janeiro, notadamente com a ajuda de um artigo do economista Mauro Osório para a Globo. Uma das primeiras supostas explicações para a crise seria um “boom” econômico (do qual comentei no primeiro parágrafo) mal aproveitado. Ora, esse boom econômico parece ter sido apenas uma impressão (talvez gerada pelo clima de tranquilidade geral) pois entre 2006 e 2016, a receita líquida corrente (a inflação foi descontada) do estado cresceu apenas 6,4% segundo o Ministério da Fazenda. Nesse mesmo período, como Mauro Osório ressalta, a receita dos demais estados cresceram em média 37,4%.

Outra explicação é que a ampliação dos gastos públicos teria aumentado o déficit do estado. Não foi exatamente o caso de considerarmos que entre 2006 e 2016 houve até uma diminuição de 0,5% do total de servidores estaduais, os mesmos que hoje não recebem salários (considerando as contratações para o projeto das UPPs). Houve de fato um aumento de salários e organização de planos de carreira mas o Rio de Janeiro e o Espírito Santo são os dois estados que menos gastam proporcionalmente com o pessoal ativo.

Enfim, uma ultima explicação que Mauro Osório desmente é que seria por culpa de incentivos fiscais: estes teriam impactado negativamente o ICMS (imposto sobre circulação de mercadorias e serviços) e o total da receita estadual. Porém, o Ministério da Fazenda mostrou que a receita do ICMS aumentou entre 2006 e 2016 (e cresceu mais rápido que a receita total do estado). Mas podemos fazer uma crítica a Mauro Osório que não considerou as isenções fiscais nos seus cálculos, como as ajudas fiscais de Sérgio Cabral, ex-governador do Rio e hoje preso em Bangu, a joalherias ou a empresas durante as Olimpíadas. Uma anedota sobre esse assunto: a rua Garcia D'Ávila, em Ipanema, é repleta de lojas de luxo onde Cabral vinha abastecer-se. A rua possui uma Hermès, uma Louis Vuitton, uma H.Stern e uma Antônio Bernardes (apenas alguns exemplos). Esta última fechou recentemente, imagino que não tenham superado a prisão de Cabral, seu principal cliente, coitados. É certo que as isenções fiscais não tenham sido a principal causa da crise, mas com certeza não ajudaram.

Depois de desmentir essas teorias sobre a crise (ignoramos as teorias que culpabilizam a CIA ou FMI), passemos então às reais causas dela. Mauro Osório ressalta algumas razões históricas para essa crise: a transferência da capital para Brasília mas principalmente a “carência de reflexão e de estratégias consistentes de fomento ao desenvolvimento socioeconômico regional”. De fato, em seu suposto “boom econômico”, o Rio de Janeiro passou também por uma suposta fase de segurança que passava principalmente por um controle mais forte dos mais pobres. Em números, a pobreza não diminuiu consideravelmente. Outro fator importante foi um clima político hegemônico desde o golpe de 64 (de direita e esquerda) que favoreceu a criação de milícias e organizações criminosas cada vez mais importantes, por exemplo. Mauro Osório dá o exemplo do várias vezes governador do Rio de Janeiro Chagas Freitas, que deu origem ao nome “chaguismo” que designa a sua forma de ganhar as eleições usando o órgão estatal.

Mais recentemente, e de enorme influência, foi a grave queda das receitas dos royalties, principalmente os royalties ligados ao petróleo do pré-sal (royalties é uma palavra em inglês que significa regalia ou privilégio. Consiste em uma quantia que é paga por alguém ao proprietário pelo direito de usar, explorar ou comercializar um produto, obra, terreno, etc.). Essas receitas regrediram de 12 bilhões em 2013 para 4 bilhões em 2016. Em 2017, já houve um aumento significativo para 7,11 bilhões gerados pela industria de petróleo. O governo estadual também prevê uma receita de 10,5 bilhões para 2018. De qualquer modo, a atividade petrolífera prometia grande desenvolvimento, principalmente durante o governo Dilma e sua campanha quanto ao pré-sal, porém esses planos parecem ter ido por água abaixo com a queda dos royalties mas também a crise ligada a Petrobras, cuja sede também se encontra no centro do Rio de Janeiro. Nesse setor em particular, o cenário internacional também não ajudou: a crise das matérias-primas foi mundial.

O Rio de Janeiro também foi a sede de grandes eventos mundiais, que deveriam ajudar a criar uma boa imagem da cidade, mas seus efeitos foram completamente contrários aos previstos por seus organizadores e defensores (o governo federal e estadual, além de companhias privadas).

Primeiro, a Copa do Mundo de 2014 . Esta não occoreu apenas no Rio de Janeiro (felizmente) mas custou 27,8 bilhões (8,3 em estádios, 8,7 em mobilidade, 6,3 em aeroportos e 1 em obras ao redor dos estádios). Enquanto a FIFA lucrou 8,3 bilhões, o Brasil ficou com elefantes brancos e gastos de manutenção. No caso do Maracanã, estádio de repercussão internacional para o Rio de Janeiro, se tornou um estádio de elite com suas diversas reformas e processos de gentrificação. Só para a Copa, sua reforma custou mais de um bilhão. As dívidas estaduais aumentaram e o evento não aumentou significalmente o número de turistas. O resultado final da Copa (além do 7 a 1) foi um cálculo mal feito.

Porém, a Copa não afetou o Rio de Janeiro mais que as outras regiões em que construíram estádios. Foram as Olimpíadas de 2016 uma das principais causas das dificuldades econômicas do estado, que já estavam fortes antes do evento começar. Isso nem é um fenômeno carioca pois as Olimpíadas nem sempre foram positivas para várias outras cidades ao redor do mundo. As Olimpíadas de Montreal, no Canadá, de 1976 deixaram a cidade com dívidas por 30 anos. As Olimpíadas de 2004, em Atenas, cidade onde foi criado esse evento esportivo na Antiguidade, acumulou dívidas que piorariam a futura crise financeira do país.

O total dos custos das Olimpíadas do Rio de Janeiro foi de 41,03 bilhões (embora alguns economistas calculam que o número possa ser ainda maior), um orçamento maior que o da Educação Nacional. A chamada “Matriz da Responsabilidade”, órgão composto por agentes do poder público e privado, bancou 7,23 bilhões, as políticas públicas 24,6 e o Comitê Rio 9,2.

De acordo com a prefeitura, 58% do total foi então bancado pela iniciativa privada e 42% pelo poder público. Por um lado, alguns economistas acham suspeito esses números dizendo que muitas empresas foram beneficiadas por isenções fiscais (Coca-Cola, McDonald's, Globo e Bradesco, por exemplo) que custarão cerca de 3,83 bilhões segundo a Receita Federal, cerca de 3 vezes o orçamento da Cultura. Pelo outro, algumas suspeitas giram em torno das obras públicas. O poder público foi um ator importante para a construção do BRT e do Porto Maravilha e bancou a Linha 4 do Metrô, que é hoje acusada de fraude. Ainda não sabemos se houve superávit em outras obras.

A universidade de Oxford, por exemplo, escreveu um relatório dizendo que os custos finais e oficiais foram 51% superiores ao inicialmente planejado. Além disso, em nenhum cálculo oficial foram consideradas as indenizações (se houveram) às várias remoções populacionais feitas para a construção das infraestruturas olímpicas (lembrem-se da Vila Autódromo).

Qual foi o famoso legado das Olimpíadas ? Segundo o Rio Media Center 1,17 milhão de turistas frequentam o Rio nos 17 dias de competição, gastando 4,1 bilhões. A maioria era brasileira (paulistas, gaúchos e mineiros principalmente) e não internacional. Hoje em dia, o Ministério do Esporte e a Prefeitura procuram iniciativas privadas para a utilização do parque olímpico, que custa mais de 80 milhões de reais anuais de manutenção. Muitas instalações se tornaram elefantes brancos ou foram desmontadas. Para resumir, as Olimpíadas não foram um sucesso e apenas pioraram a situação financeira do Rio.

II)Os efeitos da crise

Concretamente, a crise, como qualquer fenômeno econômico, possui, por principio, efeitos diretos e efeitos indiretos. Economicamente falando, o estado do Rio se situa em uma situação crítica quanto aos seus fundos públicos. O ano de 2017, por exemplo, terminou com um déficit (isto é, quando um estado gasta mais do que recebe) de 17 bilhões, 2 bilhões a menos do que o previsto pelo orçamento. 2018 não parece um ano promissor pois a receita líquida projetada para o ano é de 63,1 bilhões e as despesas previstas são de 73,1 bilhões, o que representa mais um déficit de 10 bilhões. O Observatório Sebrae também calculou um aumento de 80% do déficit público da cidade do Rio de Janeiro entre 2015 e 2016, passando de 4,3 a 7,8 bilhões de reais.

Déficit e dívidas públicas tendem a andar juntos, e produzem um efeito bola de neve: quando o estado entra em déficit ele se endivida para poder reduzir este déficit, mas para pagar suas dívidas recentemente adquiridas ele aumenta seus gastos e o déficit volta a aumentar, etc, etc. Apesar do corte de gastos imposto pelo governo estadual e federal, a dívida do Rio de Janeiro não diminuiu. De fato, o TCE (tribunal de contas do estado) mostrou esse ano (2018) que a dívida consolida liquida (com instituições financeiras públicas e privadas) aumentou 27,6%, ultrapassando o valor de 135 bilhões de reais, o equivalente à 269,74% da receita corrente liquida (arrecadação com tributos). Aliás o limite legal é de 200% da receita corrente liquida. A dívida também aumentou de 85 milhões nos dois primeiros meses de 2018 segundo a Secretaria estadual da Fazenda.

Em 2016 a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), junto com o governo federal, decidiu então propor um plano fiscal para tentar frear a crise. O plano incluía a suspensão do pagamento das dividas com a União por três anos junto com mais um último empréstimo de 3,5 bilhões de reais. Já em 2018, o Estado continua, apesar do acordo, a pedir empréstimos como o recente caso com o banco BNP Baribas somando 2,9 bilhões de reais, em troca de ações da Cedae. De fato, a privatização da Cedae também parece estar incluída neste acordo. A Alerj também aprovou um empréstimo de 250 milhões para a modernização da Secretaria estadual de Fazenda (que deveria estar pensando em resolver a crise e a mesma que analisou o aumento da divida pública em 2018), de 200 milhões para um programa de demissão voluntária e mais um pequeno empréstimo de 3,050 milhões para a quitação de débitos com fornecedores (os mesmos que aumentam a dívida estadual). Falando em débitos privados, estes cresceram de 10,7 à 15,9 bilhões de reais entre 2016 e 2017.

A crise financeira é então real mas, infelizmente, seus efeitos não são todos no setor financeiro. De fato, essa crise se reflete em todos os âmbitos.

Primeiramente, vemos que o grande Rio, por exemplo, apesar da bolha dos preços criada pela especulação durante a Copa e as Olimpíadas já ter estourado, continua com preços exorbitantes. A compra de imóvel é a mais cara do país (9,686 reais por metro quadrado), a cesta básica mais cara (438,36 reais) e a energia elétrica mais cara (0,910 por kilo-watts hora). Quanto ao mercado imobiliário, vemos uma clara desvalorização na maioria dos bairros cariocas devido à violência. De fato, alguns bairros chegaram a uma desvalorização de 12% entre 2015 e 2018. Quanto à eletricidade, a Comerc estima que uma das causas do custo da energia elétrica no Rio é o roubo de energia.

O Rio também está no topo em outros setores: o valor médio para comer na rua é o segundo maior do país (36,94 reais), assim como a gasolina (4,647 reais antes da greve dos caminhoneiros) e na passagem de metrô (4,30 reais). Para o custo do metrô, “especialistas citam custo com segurança e impostos como justificativas” diz o jornal Globo. Depois do superfaturamento da linha 4 do metro durante as Olimpíadas, eu não duvidaria que dentro do preço também está incluída a corrupção, o dízimo ou a mensalidade típica das mafias do transporte do Rio. A renda média real do trabalhador caiu 8% no fim de 2017 enquanto o ICMS (imposto sobre a circulação de mercadorias e serviços) é o mais alto do país: 20% (nos outros estados esse imposto varia entre 17 e 18%).

Alguns apelam para o turismo internacional como forma de justificativa dos preços altos porém as Olimpíadas não parecem ter impactado tanto no turismo como previsto. De fato, a ABIH, associação de empresas do setor hoteleiro, calculou que em julho de 2017, temporada alta de turistas, a taxa de ocupação dos hotéis ficou em 40%.

A Indústria foi fortemente afetada, principalmente no norte fluminense que, segundo alguns economistas, foi considerada a região mais afetada pela crise. De fato, a desindustrialização aumentou drasticamente e a indústria, que representa 10,2% dos ocupados do Estado do Rio de Janeiro, viu o seu numero de trabalhadores encolher de 14,5% entre 2015 e 2016 (dados da Sebrae). O ramo de serviços (que representa 54,2% dos ocupados) e comércio (18,5%) também registraram diminuições. Com exceção do setor de construção civil e militar, todo o estado perdeu empregados, somando uma perda total de 3,2% de empregados no estado.

O desemprego também foi algo que marcou essa crise. Em 2016 ele representava 11,7% dos ativos do Estado, 8,1% da Capital, 14,9% da Periferia e 13,23% no interior, o que representou um aumento de 53,8%, 70%, 53,3% e 40,1% para o Estado, Capital, Periferia e interior respectivamente, desde 2015 (dados da Sebrae). Em 2017 o desemprego já representava 14,5% do total da população ativa do Estado Fluminense segundo o IBGE. Junto com a uma queda da renda domiciliar (de 6,5% entre 2014 e 2015), o desemprego apenas aumentou as enormes desigualdades que caracterizam o estado do Rio, a “Cidade Maravilhosa”. Além do desemprego, novos tipos de empregos aparecem: o trabalho precário. De fato, o numero de empregados com carteiras assinadas diminuiu de 8% no Estado e mais de 10% na Periferia e no Interior entre 2015 e 2016. Os empregos sem carteira, por exemplo, subiram de 6,4% na Periferia no mesmo período.

Infelizmente, essa crise financeira também afeta setores
fundamentais do dia a dia como saúde e educação.

A UERJ (universidade estadual) é uma das instituições que mais sofreram com essa crise financeira. Agora já faz anos que seus funcionários não são pagos corretamente (meses são pulados, sem décimo-terceiro, remunerações parciais,etc) e as bolsas também não estão sendo entregues, o que diminui o número de alunos. Só para ter noção, as obras do Maracanã para a Copa e Olimpíadas, situado a algumas quadras da universidade, somaram 1,3 bilhões de reais, o equivalente a um ano custeando a UERJ. A universidade, pioneira do sistema de cotas, mal consegue sustentar o sistema que ela criou.

E ela não é a única universidade com problemas: a universidade estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (cerca de 6000 alunos) sofre com a falta de salários e de serviços de segurança, assim como cortes de energia. De acordo com o Movimento Unificado dos Servidores Públicos Estaduais (Muspe), mais de 200 000 funcionários, aposentados e pensionistas estão com seus vencimentos atrasados (dados de 2017). No caso dos aposentados, a situação pode ser mais preocupante pois estes precisam de mais remédios e, sem algum tipo de remuneração, isso pode causar sérios problemas de saúde. Aposentados podem estar morrendo neste exato momento mas não entram para as estatísticas...

Falando em saúde, a situação também é caótica. Um exemplo é o do instituto Philippe Plenel, especializado em tratamento psiquiátrico, que já teve de fechar a emergência por falta de médicos e pela impossibilidade de contratar novos profissionais. Outros grandes hospitais públicos passam por grandes dificuldades para obter medicamentos ou manter seu pessoal (que também não recebem corretamente). Uma fiscalização de 2017 feita pelo Conselho Regional de Medicina do Rio, mostrou que nos 19 hospitais federais e estaduais pacientes com câncer aguardam 10 a 12 meses para o início de seu tratamento. Esse período, não somente é ilegal segundo a lei n12.732/2012 que determina a duração máxima de inúcio de tratamento até 60 dias, mas também pode ser mortal como se trata de cãncer. Assim como os aposentados, as vítimas não aparecem em nenhuma estatística. Muitos estabelecimentos têm dificuldades, por exemplo, para achar funcionários. Estes não são bem pagos e não conseguem ir sempre para seus plantões, alguns até pedem para dormir nos hospitais para “facilitar”. No Hospital Pedro Ernesto, com 500 leitos de internação disponíveis, apenas 180 conseguem ser utilizados.

Diante de uma crise que atinge todos os mais diversos setores possíveis, qual foi a reação do governo estadual e federal ? Criar um acordo de ajuste fiscal que parece já estar não tendo os resultados esperados. De fato, além da divida continuar aumentando, o teto de gastos está prejudicando o setor público da saúde e alguns empréstimos importantes continuam a serem aplicados. De acordo com o Conselho de Supervisão do Regime de Recuperação Fiscal, das 20 metas fiscais fixadas, 13 tiveram resultados abaixo do previsto e 7 ainda nem foram atendidas. No total, as medidas podem render até 8 bilhões de reais até 2030, menos que o déficit previsto para o ano de 2018. O problema, para Mauro Osório, é que o governo vê o problema nos gastos quando o real problema está nas receitas.

Conclusão

A crise é real: ela afeta todos os setores, toda a população mas principalmente afeta os pobres. Vimos dados econômicos reais e impactantes desta crise. Vimos suas consequências nos serviços públicos mas não vimos seus efeitos em um dos elementos mais preocupantes da vida pública: a violência. Para esse elemento em especial outro artigo precisa ser dedicado pois há muito do que falar.


Além do mais, a decisão de escolher o Rio de Janeiro para ilustrar a crise foi totalmente arbitrária. Se o Rio parece estar numa péssima situação, o interior e regiões mais pobres do Brasil, como o Nordeste, sofrem ainda mais. De qualquer forma é impossível negar o tamanho da crise, embora seja possível criticar as medidas governamentais para freá-la.

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