Capítulo
1: Prólogo de Kinogate
Desenho por Luca Szaniecki Cocco
É difícil dizer quantos anos compõem nossa história. Em outras palavras, é difícil determinar quanto tudo começou, quando tempo começou a ser chamado de tempo. Enfim, muitos anos atrás, talvez milhares, talvez milhões de anos, um gigantesco portal surgiu em uma imensidão verde, deserta e silenciosa.
Enormes
colunas de rocha escura, esculpidas por uma força sobrenatural,
cobriram o horizonte montanhoso com sua sombra. No centro, um portão
de ferro abria-se vagarosamente, revelando, não o outro lado do
enorme monumento, mas sim, pura escuridão, como se o universo
inteiro acabasse do outro lado da porta.
Pouco
a pouco, o deserto se tornou cada vez mais povoado por pequenas e
grandes criaturas multiformes, todas originárias do portal. Esses
tempos ancestrais, que pouco conhecemos, acabaram denominando estes
seres de “Ancestrais”. Seus corpos variavam do tamanho de um
pequeno coelho até o de um colosso, porém, todos possuíam enorme
poder. Embora poderosos, pouco sabiam do motivo de sua existência e
viviam bastante isolados um dos outros, com poucas exceções.
Com
o isolamento dos Ancestrais, em busca de um sentido para sua
existência naquela imensidão verde e misteriosa, novos seres
aproveitaram a situação para começarem a se unir. Milhares de
criaturas surgiam diariamente do portal e, ao contrário da busca
individualista dos Ancestrais, elas buscavam uma nova vida.
Humanos,
ogros, elfos, anões, fadas, centauros, vampiros, lobisomens,
esfinges, sátiros, ninfas, sereias, dragões, gigantes, golems,
harpias, grifos, leviatãs, todos se uniam em busca de um propósito
maior que eles mesmos, através da união e da construção de uma
sociedade.
Três
criaturas, em particular, foram consideradas os fundadores da cidade
de Kinogate: o chamado de Papai Noel, Coelho da Páscoa e Fada do
Dente. Não se enganem, seus nomes não foram dados pelos habitantes
da cidade, mas sim de algum subconsciente misterioso que parecia os
guiar na sua nova jornada. Os fundadores, ao lado de seus
compatriotas, construíram imensas estradas, casas, museus,
institutos, escolas, hospitais, tudo o que uma sociedade precisa para
funcionar em plenitude. Juntos, acreditavam, conseguiriam entender o
porquê de sua existência e o funcionamento do misterioso portal que
se encontrava no centro de sua cidade. Os três fundadores decidiram,
então, construir um centro de pesquisa do lado do portal, dedicado
aos curiosos e estudiosos, ávidos por conhecimento.
Fora
do alcance das jornadas solitárias dos ancestrais, a cidade de
Kinogate tomava para si praticamente a totalidade do universo. As
fronteiras do mundo conhecido, consistiam nas próprias fronteiras da
metrópole. O momento era de paz e união, todos unidos pela mesma
razão. Crime era uma palavra que desconheciam, assim como corrupção
ou ódio.
Os
anos de paz e prosperidade duraram talvez milhares de anos, marcados
pela quase total falta de descobertas, apesar de todo os esforços
dos estudiosos da Grande Torre de Papai Noel. Desde os tempos
ancestrais, pouco havia se descoberto sobre o mundo no qual viviam ou
sobre a natureza do Portal. Infelizmente, a paz não durou mais muito
tempo.
Assim
como a narrativa dos tempos ancestrais, pouco se sabe sobre como tudo
começou, porém, podemos imaginar algumas coisas. Primeiro, dizem
que tudo começou com a loucura. Alguns poucos habitantes começaram
a ter sonhos estranhos e estes os influenciavam a cometer atos nunca
vistos na cidade: roubos, agressões, assassinatos, entre outros.
Antigamente, todo habitante morto, em acidentes, por exemplo, era
ressuscitado através do Portal. Contudo, o Portal parou de reviver
as primeiras vítimas dos crimes cada vez mais frequentes. Em segundo
lugar, o clima. Os claros dias de até então foram substituídos por
cada vez mais longas noites, escuras e frias, marcadas pela queda de
água dos céus, fenômeno que foi chamado de “chuva” por algumas
xamãs. Além disso, alguns poucos habitantes, os mais marcados pela
loucura que os abatia, simplesmente sumiram e pouco já se sabia das
rotas dos Ancestrais, agora já tidos como meras lendas.
Enfim,
tudo isto foi se acumulando, até certo dia onde tudo definitivamente
se transformou em trevas. Uma chuva diluviana abateu-se sobre a
cidade, criando rios de destroços, sofrimento por todo canto. Um
enorme tremor de terra, fenômeno, assim como a chuva, nunca antes
experienciado, destruiu centenas de casas e provocou uma verdadeira
modificação geográfica na cidade. Como dito antes, as fronteiras
da cidade correspondiam praticamente às fronteiras do universo
conhecido. Com a catástrofe, Kinogate parecia haver caído adentro
das profundezas da terra; uma verdadeira descida aos infernos.
Kinogate
nunca mais viu aquela estranha luz que os iluminava durante o dia. A
chuva e o terremoto haviam criado uma enorme catástrofe em forma de
uma cicatriz que rasgava a metrópole. A cidade se encontrava agora
dividida por um enorme rio e repleta de refugiados. Muitos,
particularmente, os gigantes, decidiram abandonar Kinogate para
sempre, na esperança de um mundo melhor fora de suas fronteiras,
cada vez mais corrompidas pela insanidade. Ademais, a descida da
cidade também havia proporcionado novos perigos. Os arredores da
cidade eram contornados de uma imensidão de trevas e planícies
geladas, por onde, toda noite, monstros de sombras vinham atacar as
bordas da sociedade. Papai Noel, diante de tanta calamidade, resolveu
construir uma imponente muralha ao redor da cidade, assim
protegendo-se das criaturas de sombras. Em seguida, no objetivo de
entender melhor o que estava acontecendo com sua querida cidade, se
trancou em sua linda torre.
A
loucura que havia marcado os últimos anos de Luz em Kinogate
aumentava rapidamente, assim como o número de desaparecimentos, até
que, em um tenebroso dia, Papai Noel, Coelho da Páscoa e Fada do
Dente foram definitivamente dados como de acordo. Na ausência de seu
grande líder, a cidade mergulhou em um período de caos e guerra
onde 5 gangues finalmente se estabilizaram como verdadeiras soberanas
do território de Kinogate. Claramente influenciados pela insanidade, os líderes das gangues começaram a governar a cidade com punhos, cascos e gancho de ferro, levando ainda mais caos para os habitantes, isso sem contar as suas frequentes disputas internas.
Enfim,
o começo de nossa história se passa bastante tempo depois do
desaparecimento de Papai Noel. Ela começa com o aparecimento de
estranhos objetos no rio que divide Kinogate em dois. Os pequenos
objetos pareciam um tipo de representação visual jamais visto na
cidade. Os curiosos retratos pareciam demonstrar de uma tecnologia
alienígena que em outro universo poderíamos chamar de fotografia.
Ao redor dos 5 personagens representados em cada um dos 5 retratos,
podia-se também ver estranhas construções, muitas vezes iluminados
por uma estranha fonte de energia luminosa, muito diferente do fogo
de Kinogate. Rapidamente, os 5 retratos se tornaram fonte das mais
absurdas teorias e acendiam os olhos das 5 gangues de Kinogate que,
após algumas semanas de confusão, decidiram organizar um jogo…
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