Outro
dia eu estava andando na rua, indo para lá e para cá. Era um dia
tão pequeno, com um simples céu azul e sorrisos acenando na rua.
Cada lugar me chamando para tomar um café e conversar um pouco.
Sabemos bem que não há nada melhor do que conversar sobre assuntos
do cotidiano, para desfrutar das horas longas de pequenos dias. Uma
moça, nem tão jovem nem tão idosa, chama alguém do outro lado da
rua. Não consegui entender direito o nome, mas sinceramente, isto
não importa. Um homem se vira, vê a moça e atravessa a rua. Eles
não se tocam, não se cumprimentam, não fazem nada além de se
encarar. Uma conversa medrosa se impõe, como um casaco de inverno.
Não é à toa; havia entre eles um ar seco de incompreensão e
talvez, se por sorte eu acertar, tristes frustrações.
“Então, mudou de ideia? pergunta o homem
- Não...
E você sabe que não posso.
- Porque
nunca mais te vi lá? Você já desapareceu da minha vida e agora
some do meu dia a dia? Como você quer me ter por perto se eu não
vejo nenhum esforço vindo de você?
- Mas eu
sempre estou lá... Estranho, nunca quis tanto te ver, ou parar e
conversar.
- Um dia
nos veremos e nos abraçaremos. Hoje não é um bom dia. Agora não é
uma boa hora. Você está perdendo seu tempo e eu o meu. Sinto que
você continua teimosa. De qualquer forma, vá embora, continue sua
caminhada. Não há mais nada para conversarmos.
- Você
sabe que não posso fazer isso. Eu não quero isso, mas eu preciso de
você. Não aguento mais ficar sem te ver, sem conversar com você,
sem saber oque pensa. Eu te peço, com toda a minha alma, esqueça
este desejo estupido! Ele me faz mal. Ele me machuca, e você, entre
todos, é quem deveria saber disso.
- Não
me importa. Se realmente você quisesse me ter na sua vida, já teria
aceitado. Você continua simples demais para mim.”
Todos os passantes os encaravam.
O homem a esquartejava com olhos. As mãos... ele olhava para as mãos.
Os dedos perturbavam o corpo, não era medo, nem angústia, nem felicidade. Ela, tão pequena, tremeu o rosto e fez chover na calçada. O homem se vira e vai embora. Não estou gostando deste rapaz, pessoas assim me enjoam. A moça se vira, percebe que presenciei tudo e vem ao meu encontro. Na esquina da Rua Nelson Mandela com a Voluntários da Pátria, não havia melhor lugar para ser um pouco solidário. Ainda trêmula ela me explica quem era o homem. Ele me enjoa; e ela, não entendo, e não quero entender. Já está tudo tão complicado com esta moça. Se eu entender, vou chateá-la. Só escutar já ajuda, acho. Ela olha para mim, não pergunta meu nome, não me diz o seu, não quer saber onde moro nem o que faço da minha vida. Ela só quer um ombro. Sou péssimo para isso. A nem tão jovem e nem tão idosa moça se estica e deita em meu colo.
- Esses momentos... Não quero mais vê-lo.
O rapaz volta, roda em volta da nossa mesa, senta e a encara. A moça, percebendo que ele voltou, levanta e pula em cima dele, arranhando seu pelo ruivo. Gatos tem este jeito; resolvem as coisas, entre si, de forma bem simples e direta. O gatinho arranhado entra em um canto e some. A gatinha, ainda triste, deixa tudo o que aconteceu de lado, volta para meu colo e me deixa acariciá-la. Ela ronrona, parece estar melhor. Seu pelo era bem macio, tão bom para fazer um cafuné eterno. Os desejos dos gatos são sempre supremos, por isso a teimosia entre os dois. Mas agora, sentindo-a passear entre meus dedos, vejo que ela só deseja um pouco de afeto, não necessariamente meu.
Ela se levanta de novo, se espreguiça esticando toda a sua coluna, e desce das minhas pernas. Ela se vira e olha para mim com aqueles olhos cortados em dois. Eles viram um mundo dividido, cada parte tão igual e tão diferente.
E pensar que nós, às vezes, somos animais tão diferentes dos animais.
Uma história muito interessante e que entretém nossa cabeça. É curto, fácil e muito agradável parabéns para o Miguel Boisseleau, criador dessa historinha.
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